De como celebrar um rito e ficar a descoberto

quarta-feira, 22 de abril de 2009


Hoje, 22 de abril de 2009, quarta-feira, marcou a data oficial do descobrimento do Brasil. São, portanto, 509 os anos que estamos a descoberto, nus como os primeiros silvícolas avistados pelas naus portuguesas. Por vezes com frio, por outras com calor na bacurinha, vamos, de ventos em ventos, ao Deus dará, quando muito, se outros cobertores não nos aquecem, com uma fina chita ou uma malha fina trançada de artesanato, até transparente, de tão fina.


Assim, de calor ou de frio penamos, posto que estamos descobertos, e não reclamamos não: fazemos do descobertor um manto protetor. De alguma forma, como se diz, Deus há de prover (claro que eu, cético, não acredito nisso). Mas, nem era isso que ia escrever aqui e já me vai a pena (teclado) a traçar o que lhe bem vai no fio (no sem fio, se no computador, porque wireless).


Quero marcar a data porque hoje fechei um ciclo, assim como o Brasil, passado de anos, abre mais um a descoberto. E, assim como o País antes velado, estou desvelado. Foi hoje a minha colação de grau na faculdade de gastronomia. Colação, em latim, é collatione, que significa comparação, ou seja, quando você se compara (ou equipara) a outra pessoa. No caso, eu me equiparei, no papel, a um chef de cozinha. Eu disse no papel. Na prática, é outra história. Assim, colar grau equivale a adquirir o direito legal de ser comparado a outros profissionais da área em questão.

E eis que chego ao âmago do post (não, eu ainda nem comecei, estou prolixo). Ao final da longa cerimônia - das 19:00 às 23:00 horas, com 157 discursos e mais de 300 formandos (gastronomia, hotelaria e turismo, todos juntos), colei grau e sou chef. De nada, sem chapéu, sem fogão, sem história ou receita arrebatadora. Mas, contudo e porém, sou, legalmente (e não loiro), chef.


Assim que foi encerrada oficialmente a cerimônia - realizada no Círculo Militar de São Paulo (obviamente, sem os cadetes trajados em roupas de gala porque não somos, acho, debutantes) -, uma taça, inopinadamente chamada de champagne, nos foi servida. Claro que não era champagne. A bebida champagne tem nome, sobrenome e pedigree, conforme você pode constatar neste link. O que nos foi servido (e eu tinha certeza que seria assim) foi a sidra, que é vinho, ou talvez um aspirante a espumante, de maçãs fermentadas. E, detalhe, sidra nacional (não confundir cidra com sidra; cidra é fruta da cidreira para fazer doces e compotas).


A legítima sidra, procedente de boa colheita de maçãs, tem origem na região autônoma de Madeira, em Portugal, especificamente na região de Santo Antonio da Serra. Terra e serra banhadas pelo oceano Atlântico, tem montanhas e está a uma altitude de 667 metros, o que a torna lugar privilegiado para o cultivo de excelentes maçãs (se diz pêro, também, em Portugal) e, por consequência, uma ótima sidra. A região tem, inclusive, uma mostra anual de sidra.

Pois que para cobrir o post, descoberto que está como o País que abriga este blogueiro, a sidra nacional não tem, exatamente, um terroir. Um dos fabricantes mais tradicionais de sidra no Brasil apenas relata assim a matéria-prima para o fabrico de sidra: "desenvolvida especialmente para sidra, esta maçã (??) é uma variedade mais específica". Bem, como há mais de 7,5 mil espécies de maçã em todo o mundo, fico sem saber e deixo falto desse conhecimento também o(a) leitor(a).


De forma que celebrei colação de grau, descobrimento do Brasil e um ciclo que se fecha, que eu defino como mais um rito de passagem, com a legítima sidra brasileira, sem saber o que, exatamente, eu bebi. Melhor assim. Ficamos, o Brasil e eu, a descoberto, prontos para novas e instigantes (e espumantes) aventuras.

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