Peludo, verde e com goma viscosa

quinta-feira, 30 de outubro de 2008


Eu sei, eu sei! Mas, não tenho nada que ver. É assim mesmo: tanto mais a comida se parece com o sexo e com sugestões de sacanagens, menos o(a) leitor(a) presta atenção no verdadeiro foco do post, que vem a ser, único e exclusivamente, sobre comida. Vê? A comida, o ingrediente, o modo de preparo, o balançar das ancas ao fogão, o rodopio entre um prato e outro, o calor que poreja na fronte, um passar de língua no fino bigode de suor que teima em brotar nos lábios e, pronto! mais uma cena sensual, a alimentar o fogo eterno do sexo.


A comida é sensual sim. Não nego. Prepara-se a comida como se faz com as preliminares: no início, um lento e gingado jogo, sinuoso e delicado, com atenção minuciosa aos detalhes. Depois, um trem que descarrila: piuíííííí ... piuíííííí .... A fumaça jorra feito maria-fumaça, em grossas nuvens que anunciam tempestades.

Mas, basta que eu me lembre de uma coisa - sexo - para que a outra - comida - caia no esquecimento. Sempre com um pé no quarto e outro na cozinha, quero fazer lembrar ao(à) leitor(a) que o título deste post não tem nada de sacana: é apenas e tão-somente a descrição - algo sórdida, concedo - do quiabo.


O quiabeiro (Abelmoschus esculentus) nos veio pelas mãos dos africanos escravos. O fruto é uma cápsula fibrosa, coalhada de pequenas sementes brancas redondas. Está em meia dúzia de pratos regionais e é fartamente admirado, embora ou por conta do esculento suco. Caruru (quiabo cozido com camarão), Frango com Quiabo, Refogado de Carne com Quiabo, Quiabo Frito, Salada de Quiabo. Uns são atraídos pela gosma. Outros, não gostam - ai, que nojo! - mas, basta que se esconda a gosma e os(as) danadinhos(as) estão lá, com o quiabo na boca.

Evita-se a baba ao fritar ou ao cozinhar o quiabo inteiro: quando se corta o quiabo, é impossível remover por completo o lamento do fruto.


Engraçado é que as comidas tanto têm um quê de profano quanto de sagrado. Na Bahia, o quiabo é um alimento ritual na festa dos Santos Meninos (São Cosme e São Damião): o Caruru é o prato principal do evento.


Não se sabe, ao certo, a origem do quiabeiro. Provavelmente, a planta é nativa da Índia. Mas, não há nome em sânscrito para o quiabo e os primitivos registros botânicos da Índia não fazem menção ao quiabo. A espécie que consumimos no Brasil é originária da Etiópia e o cultivo na África, em geral, é ostensivo. Algumas espécies de quiabeiros ultrapassam os três metros de altura. As folhas são peludas (OK, passo!), e as flores são de cor amarela, com um coração vermelho ou rosa (voluptuosidade ou paixão, por aí, por aí). O fruto pode ser de cor verde, violeta, vermelho ou branco.


(Caruru)

Com todos esses atributos, dificilmente as pessoas ficam indiferentes ao quiabo: ou o amam ou o odeiam, mas, repare, todos opinam. O quiabeiro tem uma série de denominações: abelmosco, bâmia, benda, bendé, calalu, gobo, gombô, guingombô, kingombô, quiabeiro, quiabeiro-chifre-de-veado, quiabeiro comum, quimbombô, quingobô, quingombô, okra (inglês, alemão e italiano), quimgombó e quimgombó (espanhol), gombo (francês), bendi, bhindi, ockro, okra e vendai (hindú), kuang-shu-k'uei (mandarim). Eu, de minha parte, gosto dessa coisa peluda e gosmenta. O que foi? Pelo menos, sou honesto!

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