Mas, o que tem a ver a pato, em geral, com o brasileiro? Muito pouco, na verdade. O consumo de carne de pato no Brasil é baixíssimo - cerca de 20 gramas anuais, ante 1 Kg na China e 450 gramas nos EUA - e, em São Paulo, o pato custa três vezes mais do que o frango.
O Pato de Pequim é, em São Paulo, mais popular do que o Pato no Tucupi e, claro, custa mais: enquanto o Pato no Tucupi custa, em média, R$ 50, o Pato de Pequim não sai por menos de R$ 120. É a eterna dicotomia da cozinha brasileira: ir lá fora buscar o que se tem aqui de forma muito mais rica.
O Pato no Tucupi talvez seja, ainda mais do que a Feijoada, o prato que melhor representa o Brasil na gastronomia mundial: aglutina em si o terroir brasileiro, típico, indígena. Mais autêntico do que isso, é quase impossível. O preparo e a elaboração do Pato no Tucupi, basicamente, são diretamente herdados dos índios. Os ingredientes são nativos: folhas de chicória (é um tempero verde nativo da Amazônia, diferente da verdura de mesmo nome conhecida nas regiões Sul e Sudeste), o tucupi (sobre o qual este blog fez um post específico), alho, alfavaca (outro post específico aqui), jambu (que causa dormência nos lábios) e pimenta-do-cheiro. E, claro, o pato (que, este ano, faltou para a Festa do Círio de Nazaré de Belém).
Os especialistas das cozinhas regionais do Pará, como o chef Paulo Martins, dizem que o prato deve começar a ser preparado um dia antes de ser servido. A melhor carne da ave vem daqueles patos criados em confinamento, específicos para abate (tal qual na França e na China). O tucupi deve ser legítimo, de procedência conhecida (no mercado Ver-o-Peso, de Belém, é comum encontrar o tucupi em garrafas descartáveis de refrigerante).
O pato foi uma das primeiras aves domesticadas pelos índios na região e o tucupi é uma criação indígena, cujo preparo mais autêntico prevê, inclusive, o uso de equipamentos e vasilhames especialmente desenvolvidos para a obtenção desse caldo.
Eu creio que o valor do Pato no Tucupi está relegado. Por uma série de motivos. Por que pedir magret de canard (peito de pato), e não pato no tucupi em São Paulo? Por que investigar o pato laqueado da China ao invés de fazer o beiço adormecer com as folhas de jambu? É preconceito ou desconhecimento? Ainda estou para descobrir o que faz com que o comensal prefira fazer uma viagem intercontinental pelo cardápio ao invés de fazer escala nas demais regiões brasileiras. Há um jet lag gastronômico brasileiro que precisa ser melhor avaliado.
Comments
3 Responses to “Lá vem o pato ...”
Post a Comment | Postar comentários (Atom)
Sim, compreendo o que dizes. Isso acontece em Portugal, mas não só relativamente à comida. Tudo o que seja estrangeiro é bom, se é Português não vale. Há uma total desvalorização do que é nacional.
13 de dezembro de 2008 às 19:02Penso, no entanto, que muita gente te diria, se lhe perguntasses, que a comida portuguesa é a melhor do mundo! Incluo-me nesse grupo!lolol
Ah, arrozinho de pato, que bem que me sabias agora...lol
Um beijo enorme!
Ana
Ana, não afirmo de nenhuma comida que é a melhor do mundo a não ser a comida doméstica da mãe que essa é imbatível, para cada um de nós. Sim, amo a comida portuguesa e aqui em São Paulo a tábua de doces do Antiquarius, tradicional restaurante português, é imperdível. Agora, esse sentimento do brasileiro - e do português - em relação ao produto local deve estar nos genes. Não é possível! Em visita ao Brasil, não deixe de passar no Antiquarius. Beijo!
14 de dezembro de 2008 às 17:54Eu gosto muito do frango. E o pato tem um sabor que é muito semelhante ao de galinha. Acho que a diferença entre pato e frango. Para mim tudo é o mesmo. Ambos têm penas. Minha esposa sempre quer ir a alguns restaurantes em santana que vendem pato. Mas, para mim, tudo tem o mesmo gosto.
31 de janeiro de 2013 às 14:42Postar um comentário