Coma uma bola de fogo

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008


Da junção das palavras africanas àkàrà (bola de fogo) e je (comer), nasceu, no Brasil, a palavra acara-je (comer bola de fogo) que, abrasileirada, tornou-se acarajé, um dos quitutes mais típicos existentes na Bahia.


O acarajé é feito de massa de feijão-fradinho, cebola e sal e é frito em azeite-de-dendê. Quando servido, deve ser acompanhado de pimenta, camarão seco, vatapá, caruru e salada. Nas vezes em que estive em Salvador, jamais me esqueci de comer acarajé. Típico, apimentado, bem cheio de recheio. Delícia!


No ritual do candomblé, o acarajé é comida da orixá Insã. Na mitologia Yoruba, Insã é Oyá (e também Oya-Yánsàn), que é a senhora dos ventos, raios e tempestades. O elemento de Oyá é o fogo e o metal é cobre. O culto da orixá está associado à morte e aos ancestrais: Oyá sabe lidar com os eguns e é quem os encaminha. Iansã foi esposa de Ogum e também uma das três mulheres de Xangô. E divide com Xangô a propriedade de soltar fogo pela boca e, ainda, o acompanha nas batalhas. A origem do acarajé explica-se pelo mito sobre a relação de Xangô com as suas esposas - Oxum e Iansã. O quitute é uma oferenda a esses três orixás.


Até mesmo na comercialização banal, o acarajé não perde, para as baianas, a conotação de sagrado. Por esse motivo, a receita, embora não seja secreta, não pode ser modificada e, conforme o ritual, deve ser preparada apenas pelos filhos-de-santo.

Para se fazer o acarajé, o feijão-fradinho deve ser quebrado em um moinho em pedaços grandes e ser colocada de molho na água para soltar a casca. Depois disso, passa-se o feijão novamente pelo moinho, até se obter uma massa bastante fina. A essa massa acrescenta-se cebola ralada e uma pitada de sal.


Segundo as baianas, o segredo para que o acarajé fique macio está no tempo gasto para bater a massa. O ponto correto da massa é quando adquire a consistência de espuma. Ao fritar o acarajé, deve-se usar uma panela funda com bastante azeite-de-dendê. Novamente, há uma maneira correta de se fritar o quitute: usam-se duas colheres, uma para pegar a massa e outra, de madeira, para moldar o acarajé. E, claro, azeite fervente. O primeiro acarajé frito é oferecido a Exu, que, no candomblé, tem primazia. Os demais são fritados e oferecidos aos orixás para os quais se destinam.


Na Bahia, o acarajé é um dos principais produtos vendidos nos tabuleiros das baianas. Esses acarajés diferenciam-se em relação aos acarajés dos orixás no tempero e no sabor. A forma de preparo é a mesma. O que muda é a maneira de se servi-los: o acarajé pode ser cortado ao meio e recheado com vatapá, caruru, camarão refogado, pimenta e salada de tomate verde, vermelho e coentro.

O quitute mais famoso da Bahia é semelhante a um outro prato típico baiano, o abará. A diferença está na cocção: enquanto o acarajé é frito, o abará é cozido no vapor.

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