Saudade amarga feito jinjilo

domingo, 14 de dezembro de 2008


Do amargo ao doce, basta tentar e experimentar. Pois é! Existe doce de jiló. O jiló (Solanum gilo) é um fruto, e não um legume, como se imagina popularmente. E é um dos frutos mais amargos de que se tem notícia. Mas, tudo o que é amargo pode ser adocicado até se converter em algo suave (ou quase tudo, desde que se trate de não-humanos).


Volta-se, aqui, à questão da dicotomia da cozinha regional e universal: a eterna distensão entre o doce/amargo, ácido/suave, quente/frio, picante/leve. Todas as cozinhas do mundo se deparam - e trabalham - esses maniqueísmos inerentes aos alimentos de origem vegetal, animal e até mesmo mineral.


E isso, na minha opinião, é uma das graças e charme da cozinha. O poder de converter um alimento em outro, de abusar da natureza e converter o pré-conceito que se tem de um determinado alimento para reinventá-lo em outra dimensão desconhecida, e saborosa.


Não à toa, o cancioneiro Luiz Conzaga fez a relação entre as dores da saudade e a amargura do jiló:

Ai quem me dera voltar
Pros braços do meu xodó
Saudades assim faz doer
E amarga que nem jiló


O jiló, ou jinjilo, é de origem desconhecida - ao que parece, veio da África ou da Índia - e chegou ao Brasil no século XVII, por meio dos escravos que eram enviados para trabalhar nos canaviais de Pernambuco. Mas, há até teorias que defendem que o jiló pode mesmo ser nativo do Brasil, dada a sua abundância no País.

O fruto pode ser consumido de diversas formas: conserva (salgada), à milanesa (já num processo de miscigenação com a cozinha italiana), compota (doce, como figo, por exemplo), recheado com carne moída (como a beringela), e até como tira-gosto para acompanhar bebidas alcóolicas (o jiló, nesse caso, pode ser servido como a própria beringela também, em conserva).


O fato é que há algum preconceito por esse fruto (inclusive, mea culpa, de minha parte). Mas, ao se descobrir as variáveis que um ingrediente pode oferecer, fica difícil resistir à tentação de 'domar' o respectivo alimento ao nosso bel-prazer. Vou tentar fazer uma compota de jiló, eu que sou um viciado em doces.

Comments

4 Responses to “Saudade amarga feito jinjilo”
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Anônimo disse...

"Guilty as charge": para guloso, guloso e meio..lol

beijo

Ana

16 de dezembro de 2008 às 17:45
Redneck disse...

É uma delícia o pecado da gula, não? E com doce, fica ainda mais prazeiroso. Beijo!

16 de dezembro de 2008 às 23:51
Vanusa Babaçu disse...

Giló.... nossa! Cometo pecados degustando esse frutinho!
Fritinho no alho e oleo, fatiado cru e servido com molhos, refogado, nas caldeiradas de chambaris, afff! com quiabo, com arroz branquinho. tenho pra mais de 50 receitas de como se deliciar num bom brato do inesquecivel "GILÒ!

Fico babando, e pra ser ainda melhor ganho da plantação de minha irmã Maria Augusta que faz plantação exclusiva para minha gula!

23 de abril de 2009 às 17:15
Redneck disse...

Vanusa, é raro encontrar alguém que seja tão afeita como você ao giló. Eu mesmo tenho uma série de restrições por conta do gosto. Mas, da forma como você diz, dá até vontade de comer. Beijo!

24 de abril de 2009 às 19:30